segunda-feira, outubro 01, 2007

Pai do Céu

Raios partam a educação demasiado extremista seja em que direcção for. E, obviamente, no meu caso específico, refiro-me a uma coisa a que podemos chamar, de um ponto de vista católico, a "educação para a Fé". Não há nada que eu não saiba, da "educação para a Fé". Sei as bases e as teorias, mas nunca vivi nada, concretamente, do que é a . Numa conversa que tive, há uns tempos, acabei por deixar a minha mãe completamente frustrada e zangada, até, só porque disse qualquer coisa do género "nunca senti esse encontro com Cristo, que é suposto sentir". Nunca senti, de facto, e continuo a não sentir. Talvez seja só esta característica minha de contrariar, não o que está fora de mim, mas aquilo de que faço parte. Dá-me muito mais prazer contrariar as pessoas que me rodeiam, o meio que me envolve, do que aquilo que não me diz nada. Embora, sim, eu seja uma pessoa que contrarie tudo, muitas vezes só porque sim.
Passei três anos numa instituição da diocese de Lisboa, o Pré-Seminário, com encontros mensais que eu desejava, por tudo, que passassem rapidamente, para poder ficar mais um mês livre, sem nunca ter tido a coragem de dizer que não queria mais continuar ali. Eventualmente, os formadores lá se aperceberam que eu não tinha perfil para uma coisa daquelas. Demasiado elitista, sei lá, fazia grupos e não saía de dentro deles - não me sentia sequer seguro, fora deles. Demasiado calão e tímido, recusava-me a fazer desporto, fingindo muitas vezes que tinha esquecido o equipamento, ou coisa do género. Estou consciente da minha vertente Amélia, quando toco numa bola, e, francamente, não estava para ouvir os colegas e os formadores a criticarem uma coisa para a qual, simples e evidentemente, não tenho jeito nenhum. E o desporto, coisa para a qual não tenho integralmente falta de jeito, consistia unicamente na prática do futebol, para o qual, esse, sim, não possuo a menor inclinação. Aprendi "bases" e teorias várias da religião cristã/católica, não me é difícil conceber um deus uno e trino, como não me é difícil conceber os deuses antropomórficos (e por demais humanos) da mitologia greco-romana, ou os deuses egípcios ou nórdicos. A mitologia cristã é, em mim, só mais uma mitologia (menos interessante e empolgante, em muitos aspectos, aliás), e interessante apenas nesse mesmo sentido (a mitologia, no seu todo, é das poucas coisas que me apelam verdadeiramente).
Perguntavam-me, há dias, porque continuo a ir à missa todos os Sábados, porque continuo a acolitar e a cantar salmos, e a verdade é que, embora não sinta esse encontro com Cristo, como era suposto que sentisse, embora discorde de muitas tomadas de posição da Igreja, enquanto instituição, embora, em tantos e variados aspectos, não viva nem pense de acordo com a Igreja, com a qual supostamente estou em epiclese e comunhão, sinto-me aceite e útil, e isso é mais do que me sinto em qualquer outra situação ou ocasião. E não deixarei de ir enquanto assim for.
Acredito em deus, no sentido lato, e simplesmente identifico a imagem do Deus da cristandade com essa figura em que acredito. Acredito nos apóstolos, mas acho São Paulo uma "aberração", e sinto que foi por "culpa" dele (ou de quem quer que seja que o tenha "inventado") que a Igreja tomou o rumo que tomou.
Acho ridículas, certas contradições da Igreja. Por um lado, dizem (dizemos, vá...) que Deus nos criou livres, livres para estar n'Ele ou fora d'Ele (pecado), para pensarmos o que quisermos, para vivermos de acordo com os nossos princípios, mas essa mesma livre-vontade é posta em causa quando, por exemplo, e cinjo-me a um exemplo muito concreto, não conseguimos - não conseguimos mesmo, de um ponto de vista quase fisiológico - amar toda a gente, nem sequer os mais próximos, e temos de amar. Porquê? Porque está na Bíblia, porque me mandaram. Um Deus que nos cria livres, por outro lado, tem uma instituição que nos ordena coisas a representá-lo. Que acredita num livro "porque sim", e não se discute o porquê. Um livro que foi compilado dessa forma, porque São Jerónimo queria que fossem lidos e conhecidos apenas certos evangelhos, os que eram mais de acordo com o que o Papa de então achava, e que "calariam" os grupos de cristãos que pensavam de forma diferente, unindo-os todos sob uma suposta Bíblia "oficial" (a Vulgata, ainda hoje texto oficial da Bíblia cristã).
E acho que, enfim, por hoje, por agora, é tudo o que consigo dizer. Talvez pegue nisto daqui a uns tempos, há coisas que tenho a certeza de ainda querer falar, mas não sei como as inserir no texto presente.

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