segunda-feira, dezembro 29, 2008

A ser forjada mentalmente

Tenho estado parado demasiado tempo, e não me refiro a empregos, essas coisas só servem para subsistir fisicamente, aparentemente, e não contam, portanto, decidi mexer-me dentro de uma coisa que me interesse, que faça sentido, e tentarei, dê por onde der, criar uma espécie de revista literária, em princípio qualquer coisa trimestral associada à zona onde moro (Litoral Oeste - Caldas da Rainha, Óbidos, Peniche e, enfim, em parte, Alcobaça), mas que, obviamente, poderá evoluir para qualquer coisa mais, sendo, de resto, essa, a intenção.

A verdade é que me tenho envolvido sempre em coisas que não frutificaram por variados motivos, desde os tempos do APRE (Ajuntamento de Pré-Homens Relativamente Escrotos) e do Ossa et Cinera, ambos projectos que não deram em (quase) nada, passando pel'A Caixa e pela Linha Férrea, comunidades que, em certos aspectos, continuam "vivas", não fora o facto de já nenhum de nós, seus participantes, irmos dando azo a essa designação, uma vez que existimos, mas não participamos, e acabando em coisas de minha própria lavra, como o conFusão, blog no qual acaba por acontecer o mesmo que em todos os outros. Está tudo morto e desinteressado, é certo que comecei a ver as pessoas desinteressar-se e não fiz nada, porque não me sinto no "direito" de fazer nada, mas agora entristece-me ver o estado das coisas, é só isso que constato, sem ilacções nem acusações nem nada.

Basicamente, quero perguntar aos visitantes deste blog (partindo do princípio que ainda os há) se estão interessados em contribuir com textos de variada índole e estilo, tornando-se colaboradores deste projecto. O que acontece é que preciso de pessoas disponíveis e interessadas a 100%, pois não quero que aconteça o mesmo que em todos os outros... isto é, pessoas dispostas a trabalhar e a produzir regularmente, a manter contacto, a querer saber e discutir e pensar em conjunto tudo isto, porque a minha ideia não é, de todo, que isto seja uma coisa minha, mas sim uma coisa nossa, acarinhada e acalentada por todos quantos nela quiserem tomar parte.

Podem-me contactar pelo meu e-mail, groze@sapo.pt (não é mail do messenger, é só mesmo para receber correio electrónico), os que me tiverem nas suas listas de contactos do messenger, digam-me qualquer coisa lá, ou, então, deixem um comentário a este texto com alguma forma de contacto para podermos discutir este assunto com mais tempo e clareza.

Desde já, um enorme abraço a todos.

quarta-feira, dezembro 24, 2008

Tempus Fugit

O tempo rodeia-me com as suas florestas,
os seus atalhos, os seus rios de instantes
brancos como as pupilas dos deuses.
Mas empurro-o: como se me obedecesse.
O tempo trata-nos como se fôssemos
animais de carga, casas desabitadas,
rochedos expostos num litoral de inverno.
São visíveis as suas marcas,
e ele obstina-se nesse trabalho como se fosse
uma arte, um exercício de gosto.
Cinzelador de imperfeição, raptor
do presente: quem poderá fugir
às suas mãos? Então, lembro-me de ti.
O verão batia nos toldos, fazia brilhar
as pedras, arrancava a luz aos tampos
das mesas. Ambos, fazíamos com que o tempo
não existisse; e o vento ajudava-nos,
não deixava que se aproximasse,
fazia com que entre nós e ele
batessem as folhas dos arbustos, como
grandes espantalhos verdes. De que serviu,
tudo isso? A tarde avançou por dentro de nós;
não sei onde estás; ouço, de quando em quando,
alguém dizer o teu nome: e não sei
se, hoje, reconheceria o teu rosto,
se me cruzasse contigo nalgum lado. É
o tempo. Como sair da floresta?, pergunto.
Como se houvesse resposta para todas as perguntas.

Nuno Júdice, in A Fonte da Vida, Lisboa, Quetzal, 1997

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Próxima sessão de cinema no CCC:



Belleville Rendez-Vous/Les Triplettes de Belleville, um filme de animação para crianças e menos-crianças (mais, até, para menos crianças, a menos que se queira que as benditas criaturinhas fiquem com medo de fazer anos e ter uma festa de aniversário, ou que passem a temer ursos de peluche e balões), depois do documentário desta passada Segunda, O Pesadelo de Darwin, que, pelos vistos, suscitou muita saída a meio. Ah, é verdade... ver documentários está in.

terça-feira, dezembro 16, 2008

O Corpo Espacejado

Perdia-se-lhe o corpo no deserto, que dentro dele aos poucos conquistava um espaço cada vez maior, novos contornos, novas posições, e lhe envolvia os órgãos que, isolados nas areias, adquiriam uma reverberação particular. Ia-se de dia para dia espacejando. As várias partes de que só por abstracção se chegava à noção de um todo começavam a afastar-se umas das outras, de forma que entre elas não tardou que espumejassem as marés e a própria via-láctea principiasse a abrir caminho. A sua carne exercia aliás uma enigmática atracção sobre as estrelas, que em breve conseguiu assimilar, exibindo-as, aos olhos de quem o não soubesse, como luminosas cicatrizes cujo brilho, transmutado em sangue, lentamente se esvaía. Ele mais não era, nessas ocasiões, do que um morrão, nas cinzas do qual, quase imperceptível, se podia no entanto detectar ainda a palpitação das vísceras, que a mais pequena alteração na direcção do vento era capaz de pôr de novo a funcionar. Resolveu então plastificar-se. Principiou pelas extremidades, pelos dedos das mãos e pelos pés, mas passado pouco tempo eram já os pulmões, os intestinos e o coração o que minuciosamente ele embrulhava em celofane, contra o qual as ondas produziam um ruído
aterrador.

Luís Miguel Nava, in O Céu Sob As Entranhas, Porto, Limiar, 1989

segunda-feira, dezembro 15, 2008

Music for Modern Dance


Menomena - Water

São 18 minutos que vos peço para aguentar, vá lá...

I

(...)

Mas:
depois que tudo
depois que tudo recebeu o nome de Luz ou de Noite
quer dizer: depois de teres partido
depois dessa revelação - cicatriz que reabriu
- não vejo nada
A cegueira invadiu-me quero a distorção
quero bater com a cabeça contra o céu
quero estar bêbado como nunca antes estive
quero que as lágrimas se confundam com a chuva
que à minha volta desastres tenham lugar
aviões caiam automóveis batam uns nos outros
em grande velocidade
que se solte o mal por todo o lado
e que à noite todos possam temer
o seu vizinho e o seu próximo.
Quero que o homem olhe suspeitoso para a mulher
e que a ambos os filhos vejam receosos
quero que o passeante de jardim se petrifique de medo
que diante de cada árvore suspeite
um vulto de agressão
que os ladrões e os assassinos saiam
dos lugares em que se escondem
quero que invadam as ruas como pragas
que cada um tema diante do outro
a sua própria sombra
e que na orla da noite todos cheguem a duvidar
até de si mesmos.
Que o meu corpo se faça espasmo
compulsivo grito
quero que isto se saiba:
olha: os pulsos abertos
o sangue que escorre
a boca
os dentes cerrados e que espumam
os olhos que se apertam e só procuram a obscuridade.
Disse:
depois que tudo recebeu o nome de Luz ou de Noite,
- porque assim?

Bernardo Pinto de Almeida, in Depois que Tudo recebeu o nome de Luz ou de Noite, Porto, ASA Editores II, 2002

sexta-feira, dezembro 12, 2008

Nota

Não sei se lamente, se, de certo modo, me congratule com isso, mas quase todos os livros que tenho são editados pela Assírio & Alvim, como é notório através dos poemas e textos vários que tenho vindo a colocar neste blog. Acho que, enfim, em última anáslise, devo à Assírio & Alvim um profundo agradecimento pel'O Livro do Desassossego, pela Obra Breve, da Fiama Hasse Pais Brandão, pelo Mário Cesariny, pelo Tolentino Mendonça, pelo Beckett, sei lá... devo-lhes muitas das melhores coisas que tenho lido.

E lamento apenas os visitantes deste blog que me vêm com frases do género "mas, oh, Pedro, tu tens alguma obsessão com a Assírio & Alvim?" Enquanto eles editarem os autores de qualidade, que editam, sim, tenho.

o artesão

O ar tesão (nato) é o ar do artesão quando em artesanato assim como o sol dado é o ar do soldado quando em ar tesão.

Lit. - «não havia braço são que pudesse romper o tesão da água», Dic. de Marinha, 505. «Correm as águas como sangue», id.

Mário Cesariny, in Manual de Prestidigitação, Lisboa, Assírio & Alvim, 2005 (primeira edição 1981)

Uma coisa a menos para adorar

Já vi matar um homem
é terrível a desolação que um corpo deixa
sobre a terra
uma coisa a menos para adorar
quando tudo se apaga
as paisagens descobrem-se perdidas
irreconciliáveis

entendes por isso o meu pânico
nessas noites em que volto sem razão nenhuma
a correr pelo pontão de madeira
onde um homem foi morto

arranco como os atletas ao som de um disparo seco
mas sou apenas alguém que de noite
grita pela casa

há quem diga
a vida é um pau de fósforo
escasso demais
para o milagre do fogo

hoje estive tão triste
que ardi centenas de fósforos
pela tarde fora
enquanto pensava no homem que vi matar
e de quem não soube nunca nada
nem o nome

José Tolentino Mendonça, in Baldios, A Noite Abre Meus Olhos, Lisboa, Assírio & Alvim, 2006

quinta-feira, dezembro 11, 2008

segunda-feira, dezembro 08, 2008

quarta-feira, dezembro 03, 2008

Para um Amigo


Brainiac - Fucking with the Altimiter

Esta música é para o João (0, icaruh, etc.), por todas as saudades acumuladas. A ver se um destes dias arranjo tempo e dinheiro para te ir visitar. Um Abraço!

terça-feira, dezembro 02, 2008

Uma das muito poucas coisas que gosto nos Radiohead

é o facto de a Paranoid Android fechar um dos melhores animes que já vi, Ergo Proxy:




e, já agora, deixo um episódio, para quem quiser... "perder tempo": aqui. (Clique-se na palavrinha sublinhada, ok? É esse o princípio dos links.)

segunda-feira, dezembro 01, 2008

terça-feira, novembro 25, 2008

Post-Tracey Fragments



Não sei ao certo o que dizer... não percebo de cinematografia, portanto não posso falar desse aspecto... dos planos e dos filtros e dos efeitos. Mas, seja lá como for, vi este filme ontem no CCC e soube-me a (tão) pouco! Delirei com as interpretações (sobretudo a da Ellen Page, notoriamente), com a banda sonora (Broken Social Scene), com a história - mas, acima de tudo, com a maneira diferente de a contar. O filme é espectacular. Mesmo. E eu preciso do dvd, porque gosto demais, para estar a sacar, e porque, sinceramente, ver uma vez... não chega.

P.S.: O excerto que coloquei não invalida que procurem algumas situações diferentes do filme. Tentem ver as partes da consulta com o/a psiquiatra. Só por isso já vale a pena. Mas o que deviam mesmo fazer era ver tudo. Deixo veementemente o conselho.

domingo, novembro 23, 2008

Outra sugestão de cinema:



The Tracey Fragments, de Bruce McDonald, com Ellen Page. Ainda vou ficando feliz com este mês, em termos de cinema, no CCC.

sábado, novembro 22, 2008

sexta-feira, novembro 21, 2008

Suposto grau de leitura de toda uma panóplia de blogs:

exanimatus:
blog readability test

lonely gigolo:
blog readability test

conFusão:
blog readability test

ossa et cinera:
blog readability test

Faz-me Espéce:
blog readability test

Linha Férrea:
blog readability test

Por enquanto, parece-me chegar. Basicamente, todos (ou quase) os blogs em que participo mais ou menos activamente (deixei um ou dois de fora propositadamente). Ah, e fiz realmente questão de copiar e colar o resultado, independentemente de ser tantas vezes igual. Quanto aos critérios, não faço a menor ideia de quais sejam. E não acho que os meus blogs sejam para génios.

Valse Sentimentale (op. 51, nº 6), de Tchaikovsky, tocada no theremin por Clara Rockmore



Sim. Eu aprecio theremin.

N.A.: Não tenho, por hábito, colocar vídeos compostos de música com imagem parada, mas foi o único que consegui arranjar, portanto, desde já, o meu pedido de desculpas.

quarta-feira, novembro 19, 2008

António Lobo Antunes apresenta o seu mais recente livro, "O Arquipélago da Insónia"



Não sei ao certo o que dizer de tudo isto. Com o que concordo, ou do que discordo; não sei até que ponto tudo isto que é dito pelo autor é mesmo a verdade do que sente, ou se são somente palavras que aprendeu a ir dizendo ao longo dos tempos, nos milhares de entrevistas, cafés literários, apresentações de livros, colóquios, seminários, debates e demais exposições de ideias que tem vindo a fazer, ao longo da sua carreira literária. Se concordo com as suas palavras? Sim, em grande parte, sim; demonstram certamente um certo ponto de vista que me é comum. Mas, sobretudo, deleito-me com os seus livros, e creio, tenho a certeza, aliás, que é isso que importa. No documentário que se fez, há tempos, sobre Herberto Helder, na RTP2, alguém dizia que o escritor se quer afastar do mundo para que as pessoas o conheçam pela sua obra, que é o que verdadeiramente é pertinente, e não através da sua pessoa e da sua personalidade e de todas as idiosincracias inerentes a isso. E, pelo menos, a mim, parece-me que António Lobo Antunes vale sozinho pelas suas obras, pelos seus livros, pelas suas cartas, pelas suas crónicas, independentemente do António Lobo Antunes pessoa viva e real e existente. Portanto, obviamente que os visitantes do blog não são obrigados a concordar com o que é dito. Nem sequer obrigados a gostar de ler o autor. Ou de gostar de alguma coisa que tenha sido escrita por ele. Mas saibam, então, que é o meu romancista predilecto. E que gosto de pensar que sei que daqui a muitos anos esta pessoa será referida como o escritor português da nossa época. O que devia ter ganho o Nobel em 98. Mas não ganhou.

(Quanto a essa questão do Nobel, lamento também informar que não gosto de Saramago, quanto mais tento ler e gostar, menos consigo atingir esse intuito. E, sim, há alguma proporcionalidade entre o meu carinho e espanto perante a obra de Lobo Antunes e o meu desencanto e desinteresse pela obra do prezado José Saramago.)

terça-feira, novembro 18, 2008

Fofura last.fmiana




É maravilhoso, o mundo da internet. Ora aí estão as nacionalidades dos artistas que mais ouço, compondo todo um gráfico percentual.

segunda-feira, novembro 17, 2008

Villes

Ce sont des villes! C'est un peuple pour qui se sont montés ces Alleghanys et ces Libans de rêve! Des chalets de cristal et de bois qui se meuvent sur des rails et des poulies invisibles. Les vieux cratères ceints de colosses et de palmiers de cuivre rugissent mélodieusement dans les feux. Des fêtes amoureuses sonnent sur les canaux pendus derrière les chalets. La chasse des carillons crie dans les gorges. Des corporations de chanteurs géants accourent dans des vêtements et des oriflammes éclatants comme la lumière des cimes. Sur les plates-formes au milieu des gouffres les Rolands sonnent leur bravoure. Sur les passerelles de l'abîme et les toits des auberges l'ardeur du ciel pavoise les mâts. L'écroulement des apothéoses rejoint les champs des hauteurs où les centauresses séraphiques évoluent parmi les avalanches. Au-dessus du niveau des plus hautes crêtes, une mer troublée par la naissance éternelle de Vénus, chargée de flottes orphéoniques et de la rumeur des perles et des conques précieuses, - la mer s'assombrit parfois avec des éclats mortels. Sur les versants des moissons de fleurs grandes comme nos armes et nos coupes, mugissent. Des cortèges de Mabs en robes rousses, opalines, montent des ravines. Là-haut, les pieds dans la cascade et les ronces, les cerfs tettent Diane. Les Bacchantes des banlieues sanglotent et la lune brûle et hurle. Vénus entre dans les cavernes des forgerons et des ermites. Des groupes de beffrois chantent les idées des peuples. Des châteaux bâtis en os sort la musique inconnue. Toutes les légendes évoluent et les élans se ruent dans les bourgs. Le paradis des orages s'effondre. Les sauvages dansent sans cesse la fête de la nuit. Et une heure je suis descendu dans le mouvement d'un boulevard de Bagdad où des compagnies ont chanté la joie du travail nouveau, sous une brise épaisse, circulant sans pouvoir éluder les fabuleux fantômes des monts où l'on a dû se retrouver.
Quels bon bras, quelle belle heure me rendront cette région d'où viennent mes sommeils et mes moindres mouviments?


Jean-Arthur Rimbaud, in Iluminações/Uma Cerveja no Inferno (Illuminations/Une Saison En Enfer), Lisboa, Assírio & Alvim, 2007

quinta-feira, novembro 13, 2008

Sepún - láiv.


Spoon - Chicago at Night

terça-feira, novembro 11, 2008

The Hold Steady - Joke About Jamaica



Garanto que esta música, apesar do nome, não é uma piada acerca da Jamaica (por mais que eu gostasse disso, enfim, lá "tenho" que respeitar quem aprecia esse bendito país e sua adjacente cultura, às vezes mais mitificada, que outra coisa, mas, pronto...), nem sequer possui referências. Ah, e em termos musicais também é qualquer coisa um bocadinho... ao lado. Da coisa jamaicana.

segunda-feira, novembro 10, 2008

Emily Bukowski

my grandmother always attended the sunrise
Easter service
and the Rose Bowl
parade.

she also liked to go to the
bench, sit on those benches
facing the sea.

she thought movies were
sinful.

she ate enormous platefuls of
food.

she prayed for me
constantly.

"poor boy: the devil is inside
of you."

she said the devil was
inside her husband
too.

though not divorced
they lived
separately
and had not seen each
other
for 15 years.

she said that hospitals were
nonsense

she never used them
or
the doctors.

at 87
she died one evening
while feeding her
canary.

she liked to
drop the seed
into the cage
while making these
little
bird sounds.

she wasn't very
interesting
but few people
are.

Charles Bukowski in You Get So Alone At Times That It Just Makes Sense, Ecco/Harpercollins, 1986

domingo, novembro 09, 2008

À laia de... coisa... informativa, ou sei lá o quê.

Diz Nuno Lopes, actor e, para todos os efeitos, pessoa, na revista Tabu, suplemento do jornal Sol (que não leio, mas estranhamente tem surgido aqui por casa), e cito: "Acho que sou o único homem de 30 anos que não bebe, não fuma, não se droga e não conduz." Caríssimo Nuno: daqui a cinco anos acho que te posso acompanhar nessa demanda, pelo menos se deixar de beber. Mas também não fumo, não me drogo e não conduzo. Até que ponto é que posso dizer que vivo?

sexta-feira, novembro 07, 2008

Why Did You Leave Me?


...


Larval - Paved With Good Intentions

quarta-feira, novembro 05, 2008

Piquena informação:

Este blog estará com actualizações (ainda mais) infrequentes, sendo que agora tenho escrito bastante mais no blog Faz-me Espéce, juntamente com um outro colega blogger (e a contar que pelo menos mais um terceiro se junte a essa pequena comunidade de pessoas com estômago fraco, às quais praticamente tudo lhes faz "espéce"). Portanto, deixo a recomendação que visitem o dito espaço. E irei, embora mais esporadicamente, colocando vídeos e músicas e textos avulsos por aqui.

N.B.: Para aquelas pessoas que não sabem muito bem como funciona esta coisa dos links no texto, saibam que se clicarem sobre as palavras "Faz-me Espéce", no texto acima (e aqui, na nota, também) são automaticamente direccionadas para o dito espaço de confluências ulcerais.

quarta-feira, outubro 29, 2008

my non-ambitious ambition

my father had little sayings which he mostly shared
during dinner sessions; food made him think of
survival:
"succeed or suck eggs . . ."
"the early bird gets the worm . . ."
"early to bed and early to rise makes a man (etc.) . . ."
"anybody who wants to can make it in America . . ."
"God takes care of those who (etc.) . . ."

I had no particular idea who he was talking
to, and personally I thought him a
crazed and stupid brute
but my mother always interspersed these
sessions with: "Henry, listen to your
father."

at that age I didn't have any other
choice
but as the food went down with the
sayings
the appetite and the digestion went
along with them.

it seemed to me that I had never met
another person on earth
as discouraging to my happiness
as my father.

and it appeared that I had
the same effect upon
him.

"You are a bum," he told me, "and you'll
always be a bum!"

and I thought, if being a bum is to be the
opposite of what this son-of-a-bitch
is, then that's what I'm going to
be.

and it's too bad he's been dead
so long
for now he can't see
how beautifully I've succeeded
at
that.

Charles Bukowski in You Get So Alone At Times That It Just Makes Sense, Ecco/HarperCollins, 1986

sexta-feira, outubro 24, 2008

some suggestions

in addition to the envy and the rancor of some of
my peers
there is the other thing, it comes by telephone and
letter: "you are the world's greatest living
writer."

this doesn't please me either because somehow
I believe that to be the world's greatest living
writer
there must be something
terribly wrong with you.

I don't even want to be the world's greatest
dead writer.

just being dead would be fair
enough.

also, the word "writer" is a very tiresome
word.

just think how much more pleasing it would be
to hear:
you are the world's greatest pool
player
or
you are the world's greatest
fucker
or
you are the world's greatest
horseplayer.

now
that
would really make
a man feel
good.

Charles Bukowski in You Get So Alone At Times That It Just Makes Sense, Ecco/HarperCollins, 1986

quinta-feira, outubro 23, 2008

Christina's World


Christina's World, by Andrew Wyeth

Não nutrindo eu particular sensibilidade para tirar partido total da pintura realista, gosto realmente das obras de Andrew Wyeth, em particular deste maravilhoso Christina's World, que inspirou, já agora acrescento essa informação, (quer o livro, quer o filme que se lhe seguiu) Tideland, de Mitch Cullin (livro) e Terry Gilliam (filme).

quarta-feira, outubro 22, 2008

Doot Doot!

Sempre gostei bastante de banda desenhada, sendo que a primeira coisa que me lembro de ter querido ser (astronauta à parte...) foi cartoonista. Na altura, e tendo em atenção as capacidades dos meus pares - todos nós ainda cronologicamente muito pouco experienciados -, tinha mesmo algum jeito para a coisa. Descobri, enfim, com o desenrolar agudo da minha existência, que domino melhor as palavras do que os lápis/pincéis/demais parafernália relativa ao mundo do desenho/pintura, e deixei essa minha precoce vocação bastante negligenciada. Nunca, no entanto, sem a ter olvidado por completo.
Sou um fervoroso amante de banda desenhada, embora, por razões sobretudo económicas, nunca tenha adquirido muitos dos livros que desejaria. Nem conheço, aliás, os grandes nomes europeus, pelo menos nada que vá muito além do Morris, da dupla Goscinny/Uderzo, do Franquin, Hergé ou do Hugo Pratt. Por "menores", que sejam, dentro do género, sempre me deu grande prazer ler e acompanhar as histórias dos comics norte-americanos, particularmente os associados à Marvel Comics ou à Dark Horse, mais recentemente a própria editora do Todd McFarlane e os trabalhos independentes do Joe Madureira. Obviamente, Frank Miller ocupa um espaço de eleição na minha prateleira, por mais lugar-comum que seja (ou vá sendo). Mas, indo directo à questão, conheci, através dos Menomena - cujos álbuns originais possuo, devendo, aliás, ser a única, ou uma das duas pessoas, em Portugal, a ostentar tal coisa como verdade factual -, particularmente através do último álbum deles, Friend and Foe, de 2007, cujo design e arte são da autoria do cartoonista e "novelista gráfico" (é sempre bom, para os entendidos que são - ou se acham - bem mais que neófitos, separar os cartoonistas de novelas gráficas dos meros cartoonistas de comics, embora isso, a mim, não me faça particular diferença...) Craig Thompson, que descobri ter feito um dos livros que considero mais bem conseguidos dentro da banda desenhada: o Blankets.
Basicamente, deixo dois links, um para o seu blog (onde poderão acompanhar a evolução do seu mais recente projecto, "Habibi") e outro para o site (relativamente desactualizado, mas interessante, ainda assim). Dêem uma vista de olhos, posso quase garantir que não se irão arrepender.

Doot Doot Garden: The Artwork of Craig Thompson

Doot Doot Garden Blog

N.B.: Há desenhos dele que são francamente reminiscentes dos tempos áureos da Nickelodeon (Ren & Stimpy, particularmente), e julgo mesmo que chegou a participar com bandas desenhadas para a publicação regular dessa mesma editora/companhia/estação de televisão.

quarta-feira, outubro 15, 2008

Parabéns, Joana! \(^-^)/


Peter McConnell - The Enlightened Florist

Deixar só uma musiquinha, que no outro blog já deixei um texto! Feliz aniversário!!!

segunda-feira, outubro 13, 2008

2

[...]

Ficas toda perfumada de passar por baixo do vento que vem
do lado reluzente das laranjeiras.
E crepitam-me as pontas dos dedos ao supor-te no escuro.
Queimavas-me junto às unhas.
E a queimadura subia por antebraço e braço
ao coração sacudido. Eu - perfumado
e queimado por dentro: um laço feito de odor
transposto, ar fosforescendo, uma árvore
banhada
nocturnamente. Tudo em mim trazido
súbito
para o meio. Quando este saco de sangue rodava
defronte da abertura
prodigiosa.


Herberto Helder in Ou O Poema Contínuo, Lisboa, Assírio & Alvim, 2005



Este texto foi aqui colocado como uma coisa que eu queria oferecer a uma grande Amiga. Su, é para ti.

Godspeed You! Black Emperor - The Dead Flag Blues


Godspeed You! Black Emperor - The Dead Flag Blues (Intro)

the car's on fire and there's no driver at the wheel
and the sewers are all muddied with a thousand lonely suicides
and a dark wind blows

the government is corrupt
and we're on so many drugs
with the radio on and the curtains drawn

we're trapped in the belly of this horrible machine
and the machine is bleeding to death

the sun has fallen down
and the billboards are all leering
and the flags are all dead at the top of their poles

it went like this:

the buildings tumbled in on themselves
mothers clutching babies picked through the rubble
and pulled out their hair

the skyline was beautiful on fire
all twisted metal stretching upwards
everything washed in a thin orange haze

i said: "kiss me, you're beautiful -
these are truly the last days"

you grabbed my hand and we fell into it
like a daydream or a fever

we woke up one morning and fell a little further down -
for sure it's the valley of death

i open up my wallet
and it's full of blood

domingo, outubro 12, 2008

Soul Coughing - Screenwriter's Blues



(Sim, às vezes penso que sou a única pessoa a gostar destes tipos, mas, enfim, gosto...)

sexta-feira, outubro 10, 2008

E, agora, uma sugestão de cinema:



Sügisball ("Baile de Outono"/"Autumn Ball"), de Veiko Öunpuu. Citando o cartaz: "Um filme para todos os homens com uma alma gentil e um mau fígado. Para os que estão sozinhos à noite. De cuecas."

quarta-feira, outubro 08, 2008

Agora, cala-te ó minha boca
que dizes a minha infância em eco.
Pára, ó minha mão que escreves
em caracteres tipográficos. Lembra-te
daquele que apanhava por ofício
as flores caídas ou lançadas murchas
e ao meditar entre as árvores engrandeceu
e fez rejubilar o filho de Shakya.

Fiama Hasse Pais Brandão, "Entre os Âmagos (1983-1987)", in Obra Breve, Lisboa, Assírio & Alvim, 2006

domingo, outubro 05, 2008

quarta-feira, setembro 24, 2008

terça-feira, setembro 23, 2008

Let's go boyscout'n!



Menomena - Boyscout'N

They're boyscout'N. Yeah!

quarta-feira, setembro 17, 2008

(T-T)


Tindersticks - Seaweed

Would you prefer a stone
That I chose for you?
That lay on a beach
Was just a sea of stone
Wasn't meant for you
Jumped into my eyes
Choice of millions
Would you prefer a stone
From your window?
It walks through the streets
Feeling young and tense
The city had to swallow mine for you
`Cause it's so much strain
Choice of only a few

Would you prefer a look
That was contrived?
Or a look that says how I’ll really keep with you?
I have no plans in my mind
Just kind of go
Go with you

A hello or a goodbye?
My mind is something I don't know
The truth, why should I lie?
Just kind of go
Go with you

terça-feira, setembro 16, 2008

161.

Nada me pesa tanto no desgosto como as palavras sociais de moral. Já a palavra «dever» é para mim desagradável como um intruso. Mas os termos «dever cívico», «solidariedade», «humanitarismo», e outros da mesma estirpe, repugnam-me como porcarias que despejassem sobre mim de janelas. Sinto-me ofendido com a suposição, que alguém porventura faça, de que essas expressões têm que ver comigo, de que lhes encontro, não só uma valia, mas sequer um sentido.
Vi há pouco, em uma montra de loja de brinquedos, umas coisas que exactamente me lembraram o que essas expressões são. Vi, em pratos fingidos, manjares fingidos para mesas de bonecas. Ao homem que existe, sensual, egoísta, vaidoso, amigo dos outros porque tem o dom da fala, inimigo dos outros porque tem o dom da vida, a esse homem que há que oferecer com que brinque às bonecas com palavras vazias de som e tom?
O governo assenta em duas coisas: refrear e enganar. O mal desses termos lantejoulados é que nem refreiam nem enganam. Embebedam, quando muito, e isso é outra coisa.
Se alguma coisa odeio, é um reformador. Um reformador é um homem que vê os males superficiais do mundo e se propõe curá-los agravando os fundamentais. O médico tenta adaptar o corpo doente ao corpo são; mas nós não sabemos o que é são ou doente na vida social.
Não posso considerar a humanidade senão como uma das últimas escolas na pintura decorativa da Natureza. Não distingo, fundamentalmente, um homem de uma árvore; e, por certo, prefiro o que mais decore, o que mais interesse os meus olhos pensantes. Se a árvore me interessa mais, pesa-me mais que cortem a árvore do que o homem morra. Há idas de poente que me doem mais que mortes de crianças. Em tudo sou o que não sente, para que sinta.
Quase me culpo de estar escrevendo estas meias reflexões nesta hora em que dos confins da tarde sobe, colorindo-se, uma brisa ligeira. Colorindo-se não, que não é ela que se colora, mas o ar em que bóia incerta; mas como me parece que ela mesma que se colora, é isso que digo, pois hei-de por força dizer o que me parece, visto que sou eu.


Bernardo Soares in Livro do Desassossego, Lisboa, Assírio & Alvim, 5ª edição, 2005

LOL!!!



YEAH!!! Carl Douglas - Kung Fu Fighting ftw!

domingo, agosto 31, 2008

The Bees/A Band of Bees - Who Cares What the Question Is?



De vez em quando sabe bem, para descomprimir um bocado. \(^o^)/

terça-feira, agosto 05, 2008

This one goes to pecusita:


Tilly and the Wall - Blood Flower


Denise, it's been a pleasure chatting with you! Hopefully I'll be visiting anytime soon - do have a bed ready!
Oh, and of course I'm also expecting you to visit and we'll surely travel all the way to Barcelona to join a demonstration against bullfighting. Both of us bare naked, no doubt about that, drinking mojitos.

domingo, julho 27, 2008

Lusofonia

rapariga: s. f., fem. de rapaz; mulher nova; moça; menina; (Brasil), meretriz.

Escrevo um poema sobre a rapariga que está sentada
no café, em frente da chávena do café, enquanto
alisa os cabelos com a mão. Mas não posso escrever este
poema sobre essa rapariga porque, no brasil, a palavra
rapariga não quer dizer o que ela diz em portugal. Então,
terei de escrever a mulher nova do café, a jovem do café,
a menina do café, para que a reputação da pobre rapariga
que alisa os cabelos com a mão, num café de lisboa, não
fique estragada para sempre quando este poema atravessar o
atlântico para desembarcar no rio de Janeiro. E isto tudo
sem pensar em áfrica, porque aí lá terei
de escrever sobre a moça do café, para
evitar o tom demasiado continental da rapariga, que é
uma palavra que já me está a pôr com dores
de cabeça até porque, no fundo, a única coisa que eu queria
era escrever um poema sobre a rapariga do
café. A solução, então, é mudar de café, e limitar-me a
escrever um poema sobre aquele café onde nenhuma rapariga se
pode sentar à mesa porque só servem cafés ao balcão.


Nuno Júdice,
A matéria do poema, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 2008.

sábado, julho 26, 2008

Erica Connor has just visited you on hi5!

Passo, em certas alturas, ao longo do ano (civil, religioso, profano, económico, escolar, laboral e, sobretudo, neste caso, "cibernético") por diversas fases - tal como qualquer pessoa, de resto, obviamente - mas custam-me bastante as épocas em que os meus... amigos de hi5 se divertem a adicionar pessoas. Candy, Carla, Musiguia, Mufie Wufie, Dennis, João (toda a multiplicidade deles), Bruno Aleixo, André, Edgar, e mais uns quantos, em várias alturas divertem-se a adicionar novos amigos, uma extrema panóplia deles (e delas, como é óbvio), presumo que a maior parte desconhecidos/as de tronco nu e tonificado/bronzeado, ou bastante decotadas, exibindo com pejo e fulgor os seus seios em supostas copas D (ou E). Isto é para quê? É para eu me sentir inferior? Caramba, juro, há dias em que o conseguem! "Ai, o Pedro, coitadinho, nem um único amigo novo de hi5, nem uma mísera adição! Também, pudera, nunca adiciona novas fotos, nunca muda de skin/layout/seja-o-que-for-que-lhe-chamem!" Eu não tenho amigos, é verídico. Os poucos que tenho já estão adicionados. E não adiciono meninas peruanas com enormes seios porque, sinceramente, não primo pela "rebarbadice" desse calibre.

Quanto às fotos, não sou de todo narcisista, para andar a tirar fotos a mim mesmo a tempo inteiro, e os amigos que saem comigo nunca levam máquina fotográfica com que registar o quão decrépitas são essas mesmas saídas e, dessa forma, registar-me a mim próprio para a posteridade - ainda que posteridade sobretudo e, até ver, apenas digital. Pensarei nisso, já que mo mencionaram, mas não será de forma alguma uma prioridade. É aguentarem-se. Ok?

Bem, será, até, possível que adicione em breve pelo menos mais uma pessoa!

segunda-feira, julho 21, 2008

Not Giving a Fuck!



That's all there is to it, indeed.

quinta-feira, julho 17, 2008

CLASH!!! (Though actually not The Clash)



Queens of The Stone Age - Like a Drug

Dead Combo - Like a Drug


terça-feira, julho 15, 2008

an unkind poem

they go on writing
pumping out poems -
young boys and college professors
wives who drink wine all afternoon
while their husbands work,
they go on writing
the same names in the same magazines
everybody writing a little worse each year,
getting out a poetry collection
and pumping out more poems
it's like a contest
it is a contest
but the prize is invisible.

they won't write short stories or articles
or novels
they just go on
pumping out poems
each sounding more and more like the others
and less and less like themselves,
and some of the young boys weary and quit
but the professors never quit
and the wives who drink wine in the afternoons
never ever quit
and new young boys arrive with new magazines
and there is some correspondence with lady or men poets
and some fucking
and everything is exaggerated and dull.

when the poems come back
they retype them
and send them off to the next magazine on the list,
and they give readings
all the readings they can
for free most of the time
hoping that somebody will finally know
finally applaud them
finally congratulate and recognize their
talent
they are all so sure of their genius
there is so little self-doubt,
and most of them live in North Beach or New York City,
and their faces are like their poems:
alike,
and they know each other and
gather and hate and admire and choose and discard
and keep pumping more poems
more poems
more poems
the contest of the dullards:
tap tap tap, tap tap, tap tap tap, tap tap...


Charles Bukowski in Love Is A Dog From Hell, Ecco/HarperCollins, 1977

quarta-feira, julho 02, 2008

sábado, junho 28, 2008

I have shit stains in my underwear too

I hear them outside:
"does he always type this
late?"
"no, it's very unusual."
"he shouldn't type this
late."
"he hardly ever does."
"does he drink?"
"I think he does."
"he went to the mailbox in
his underwear yesterday."
"I saw him too."
"he doesn't have any friends."
"he's old."
"he shouldn't type this late."

they go inside and it begins
to rain as
3 gun shots sound half a block
away and
one of the skyscrapers in
downtown L.A. begins
burning
25 foot flames licking toward
doom.


Charles Bukowski, Love Is A Dog From Hell, Ecco/HarperCollins, 1977

The Dresden Dolls - Girl Anachronism



A qualidade de som é bastante má, mas, enfim... acredito que mesmo assim, escapa. E quem não cohece a banda, ao menos pode ouvir a música.

sexta-feira, junho 27, 2008

segunda-feira, junho 16, 2008

terça-feira, junho 03, 2008

Tindersticks - My Sister



Do you remember my sister? How many mistakes did she make with those never blinking eyes? I couldn't work it out. I swear she could read your mind, your life, the depths of your soul at one glance. Maybe she was stripping herself away, saying

"Here I am, this is me
I am yours and everything about me, everything you see..."

If only you look hard enough.

I never could.

Our life was a pillow-fight. We'd stand there on the quilt, our hands clenched ready. Her with her milky teeth, so late for her age, and a Stanley knife in her hand. She sliced the tyres on my bike and I couldn't forgive her.

She went blind at the age of five. We'd stand at the bedroom window and she'd get me to tell her what I saw. I'd describe the houses opposite, the little patch of grass next to the path, the gate with its rotten hinges forever wedged open that Dad was always going to fix. She'd stand there quiet for a moment. I thought she was trying to develop the images in her own head. Then she'd say:

I can see little twinkly stars,

like Christmas tree lights in faraway windows.

Rings of brightly coloured rocks

floating around orange and mustard planets.

I can see huge tiger striped fishes

chasing tiny blue and yellow dashes,

all tails and fins and bubbles.

I'd look at the grey house opposite, and close the curtains.

She burned down the house when she was ten. I was away camping with the scouts. The fireman said she'd been smoking in bed - the old story, I thought. The cat and our mum died in the flames, so Dad took us to stay with our Aunt in the country. He went back to London to find us a new house. We never saw him again.

On her thirteenth birthday she fell down the well in our Aunt's garden and broke her head. She'd been drinking heavily. On her recovery her sight returned, a fluke of nature everyone said. That's when she said she'd never blink again. I would tell her when she started at me, with her eyes wide and watery, that they reminded me of the well she fell into. She liked this, it made her laugh.

She moved in with a gym teacher when she was fifteen, all muscles he was. He lost his job when it all came out, and couldn't get another one. Not in that kind of small town. Everybody knew everyone else's business. My sister would hold her head high, though. She said she was in love. They were together for five years until one day he lost his temper. He hit her over the back of the neck with his bullworker. She lost the use of the right side of her body. He got three years and was out in fifteen months. We saw him a while later, he was coaching a non-league football team in a Cornwall seaside town. I don't think he recognised her. My sister had put on a lot of weight from being in a chair all the time. She'd get me to stick pins and stub out cigarettes in her right hand. She'd laugh like mad because it didn't hurt. Her left hand was pretty good though. We'd have arm wrestling matches, I'd have to use both arms and she'd still beat me.

We buried her when she was 32. Me and my Aunt, the vicar, and the man who dug the hole. She said she didn't want to be cremated and wanted a cheap coffin so the worms could get to her quickly. She said she liked the idea of it, though I thought it was because of what happened to the cat and our mum.

sexta-feira, maio 30, 2008

Charles Bukowski: Poetry and Motion



Hell, yeah!

N.A.: Existe um outro vídeo que consiste em Charles Bukowski a ter um ataque de qualquer coisa muito parecida com ira/fúria/raiva, pontapeando a sua companheira. Para todas as pessoas que me têm vindo dizer "devias ter posto antes esse! Aquilo é que é um poeta!", gostaria de dizer que nem eu chego a esse estado de misogenismo/sexismo ou seja o que for. Confesso que, sim, também me rio quando vejo, mas não era capaz de publicar uma coisa dessas num espaço meu. Para além do mais, é discutível esse suposto sexismo de Bukowski, as "fúrias" aconteciam com pessoas, independentemente do género, calhou ter sido uma mulher a ser filmada. De qualquer forma, o que eu queria era a sua visão sobre a poesia - que, já agora, partilho - e a literatura, porque o Charles Bukowski que leio é o Charles Bukowski enquanto autor, e não o Charles Bukowski enquanto pessoa. O facto de o admirar relativamente enquanto pessoa não vem ao caso. Ninguém me veria (estou certo disso, pelo menos) a ter uma reacção daquelas...

quinta-feira, maio 29, 2008

Filosofia de Vida

[...]

2. Buzinou um automóvel. Uma aragem fresca, vinda do mar, percorria o meu rosto. Eu sentia-me tão vivo. Poeta do instante, aparentemente, mas será a poesia uma vocação ou uma carreira política? Aprendiz de feiticeiro sem me dar conta disso? Eterno adolescente, iludido ou hesitante sobre o sentido das palavras. O sentido? Eu pensava que só pelo sentido vivemos e morremos, era a minha obsessão. Devia ser a minha maneira de pretender que tinha uma filosofia de vida.
Tão suave a tarde de Verão. No país deserto de presenças, onde nenhuma revelação parecia possível, os figurantes do filme repetitivo do quotidiano iam desempenhando o seu papel distraidamente. Como se não soubessem que faziam parte da ficção, como se não tivesse importância o facto de tudo acabar em breve. E nós de fora a olhar, espectadores do nosso próprio destino.
Impossível fazer parte da história, entrar no enredo das vidas alheias. Tu, menina sentada no café, em vez de comeres chocolates, escrevias cartas, ouvias música, bebias água mineral. Uma filosofia de vida? Os óculos escuros tornavam-te tão inacessível como aos olhos que escondias.
Que tédio. Que confusão. Que tempo inútil.

João Camilo, in O Som Atinge o Cimo das Montanhas, Entroncamento, Ovni, 2006.

quarta-feira, maio 28, 2008

as the sparrow

To give life you must take life,
and as our grief falls flat and hollow
upon the billion-blooded sea
I pass upon serious inward-breaking shoals rimmed
with white-legged, white-bellied rotting creatures
lengthily dead and rioting against surrounding scenes.
Dear child, I only did to you what the sparrow
did to you; I am old when it is fashionable to be
young; I cry when it is fashionable to laugh.
I hated you when it would have taken less courage
to love.

Charles Bukowski, in The Days Run Away Like Wild Horses Over The Hills, Ecco/HarperCollins, 1969

segunda-feira, maio 19, 2008

Stina Nordenstam - Get On With Your Life



Um OBRIGADO enorme à Marta (sim, Marta-Nunes-Navarro-Professora-de-Física-do-Som).

segunda-feira, maio 12, 2008

freedom

he drank wine all night the night of the
28th. and he kept thinking of her:
the way she walked and talked and loved
the way she told him things that seemed true
but were not, and he knew the color of each
of her dresses
and her shoes - he knew the stock and curve of
each heel
as well as the leg shaped by it.

and she was out again when he came home, and
she'd come back with the special stink again,
and she did
she came in at 3 a.m. in the morning
filthy like a dung-eating swine
and
he took out the butcher knife
and she screamed
backing into the roominghouse wall
still pretty somehow
in spite of love's reek
and he finished the glass of wine.

that yellow dress
his favorite
and she screamed again.

and he took up the knife
and unhooked his belt
and tore away the cloth before her
and cut off his balls.
and carried them in his hands
like apricots
and flushed them down the
toilet bowl
and she kept screaming
as the room became red

GOD O GOD!
WHAT HAVE YOU DONE?

and he sat there holding 3 towels
between his legs
not caring now whether she left or
stayed
wore yellow or green or
anything at all.

and one hand holding and one hand
lifting he poured
another wine.


Charles Bukowski, in The Days Run Away Like Wild Horses Over the Hills, ECCO/HarperCollins, 1969

quarta-feira, maio 07, 2008

Para a Luísa, por demasiadas coisas em tão pouco tempo. Obrigado!



The Dresden Dolls - The Perfect Fit


can't you do it for me, i'll pay you well
fuck i'll pay you anything if you could end this

can't you just fix it for me, it's gone berserk...
fuck i'll give you anything if
you can make the damn thing work

can't you just fix it for me, ill pay you well,
fuck ill pay you anything
if you can end this
hello, i love you will you tell me your name?
hello, i'm good for nothing - will you love me just the same?

(Obrigado por uma data de coisas, mas, sobretudo, por Ti. És linda e eu sinto-me bem contigo.)

segunda-feira, maio 05, 2008

she came out of the bathroom with her flaming red hair and said -

the cops want me to come down and identify
some guy who tried to rape me.
I've lost the key to my car again; I've got
the key to open the door but not the one
to start it.
those people are trying to take my child
away from me but I won't let them.
Rochelle almost o.d.'d, then she went at
Harry with something, and he punched her.
she's had those cracked ribs you know,
and one of them punctured her lung. she's
down at the county under a machine.

where's my comb?
your comb has all that guck in it.

I told her,
I haven't seen your
comb.


Charles Bukowski, Love Is A Dog From Hell, Ecco/HarperCollins, 1977

quarta-feira, abril 30, 2008

mais apontamentos (desta vez não apenas nocturnos)

i.

a - E esse cabelo? E esses óculos da Dolce & Gabbana? E esses ténis de mitra, da Nike? Vens ter comigo e depois não dizes nada, é para vires ter com a Luísa, não é?
p - Olha lá... ténis da Nike são de mitra porquê? E essa roupinha da Stradivarius, não é de beta, nem nada? Oh sua pseudo-gogó!
a - Gótico é fixe.
(...)
a - Tens as mãos bué gordas!
p - Não é gordas, é inchadas, é do calor.
a - Mas está calor? Está um dia bué frio.
p - Mas tem estado calor.
a - As minhas ficam é roxas, da má circulação.
p - Roxo é uma cor extremamente gogó, não é?


ii.

v - Agora, também, fazem iogurtes para tudo, ele é iogurtes para ganhar peso, perder peso, para o bom colesterol e para o mau colesterol, iogurtes para a prisão de ventre e iogurtes para não cagares...
l - A sério?
v - E iogurtes com extracto de aloé vera e iogurtes para viveres mais tempo sem apetite, e de forma mais... "saudável".
p - E iogurtes para a caspa.
l - Existem iogurtes para a caspa?!
v - Existe tudo, hoje em dia...


iii.

l - Eu não me quero ir embora, quero ficar aqui contigo... é bom.
p - Eu também não quero ir, mas tem de ser, ainda tenho que ir fazer uma viagem de quarenta e cinco minutos a pé até casa... tu é só até ali abaixo e, de qualquer forma, eu vou contigo. Se quiseres que te leve. Que já é tarde.
l - Quero, sim! Mas, e tu, ficas bem? Não é perigosa, a viagem? Ainda é um bocado. E vais chegar só lá pelas três...
p - Não faz mal, andar sempre ajuda a perder o peso. E Caldas não é propriamente uma urbe perigosa, pelo menos para os lados por onde tenho de passar...
l - Ok, tu é que sabes, mas por favor jura que chegas bem a casa, e quando chegares manda-me mensagem! E espero que ninguém te assalte, ou pior...
p - Pior...?
l - Sei lá, isto, há-de tudo... podem-te violar, ou assim...
p - Se me violarem, olha, pode até ser bom, sei lá. Não dizem esses "sexólogos" das revistas cor de rosa, formados por correspondência através da prestigiada Universidade Metódico-Baptista de Salt Lake City que o ponto G dos homens é na próstata? E, para além do mais, sempre ganhava uma história interessante para contar aos meus filhos, caso algum dia venha a ter.
l - Olha, esperemos sinceramente que sim.
p - Hein?
l - Os filhos...

quinta-feira, abril 17, 2008

(Outro) Tributo a Sergio Leone



Desta vez, o vídeo foi extraído do filme O Bom, O Mau e O Vilão (The Good, The Bad and The Ugly). A música, mais uma vez, é dos Dead Combo, excepto o tema dos créditos, dos Boards of Canada.

quarta-feira, abril 16, 2008

Tributo a Sergio Leone



Um vídeo que criei, usando imagem do Por um Punhado de Dólares (A Fistful of Dollars), de Sergio Leone, e música dos Dead Combo.

O Acordo Ortográfico (e o meu desacordo)

Tem-se falado muito disso e eu próprio queria deixar a minha opinião sobre o assunto. Não vou, contudo, apresentar argumentos científicos, políticos, sociais - ou pelo menos não os abordarei como tal. Antes de mais, para que se saiba: sou contra o acordo. Muito contra, mesmo. É óbvio que, se apresentasse exemplos das palavras que serão evoluídas no acordo e nas quais as consoantes mudas têm o propósito de abrir as vogais que as precedem, ou tornar tónicas as sílabas em que se encontram, os defensores do acordo apresentariam de imediato bastantes exemplos de fugas à regra, que me deixariam supostamente desmoralizado e arrependido de ter sequer mencionado isso - ainda que todas as línguas possuam regras e excepções, mas parece-se que, sob a égide de se criar um Português verdadeiramente novo, moderno, global, evoluído e internacional, quaisquer regras que existam, se aparentemente obsoletas, têm necessariamente de ser extintas.
Falou-se muito do Inglês, como língua universal, e do suposto acordo que tornou o Inglês uma língua sem variações e sem excepções. Isto não é verdade. Os Bretões e alguns falantes de Inglês da Commonwealth têm pequenas variações das quais não se abriu mão; note-se, a título de exemplo, as palavras colour (EN GB)/color (EN US), centre (EN GB)/center (EN US). Defende-se que, para criar uma Língua Portuguesa universal, é necessário torná-la alegadamente mais representativa da oralidade (como se a ortografia fosse uma transcrição fonética absoluta - lamento desapontá-los, mas nunca foi, não é, e nem com este acordo passará a ser), logo, se as consoantes mudas lá estão e não se lêem, não fazem sentido, devendo-se, pois, eliminá-las. Facilitar a representatividade ortográfica do que se fala. Isto aconteceu no Inglês? Não. Um f, também em Inglês, vale o mesmo que um ph. Uma palavra começada por sc poderia começar da mesma forma por c ou s. O Inglês, decididamente, meus caros senhores preconizadores e defensores do acordo, não serve para ser usado como carro de batalha na vossa demanda económica e política.
Chamar-me-ão retrógrado, os defensores do acordo, nacionalista, indivíduo com manias coloniais e de superioridade em relação ao Brasil, mas prezo muito a minha identidade linguística portuguesa - portuguesa de Portugal - e não me sinto bem com essas eliminações de letras que, no meu entendimento, parco, ou não, faz realmente sentido que lá estejam. Seja de um ponto de vista sintáctico, etimológico ou meramente ortográfico. Sei que o último acordo ortográfico efectuado também gerou controvérsia e no entanto aqui estamos, todos sobreviventes ao mesmo, e é óbvio que também se sobreviverá a este, e os nossos descendentes provavelmente até acharão ridículo que os seus antepassados se tivessem batido por isto. Mas é que isso não me interessa (estou desde já consciente que um argumento tão egoísta, pessoal e desinteressado no suposto futuro das gerações vindouras vai suscitar ironiazinhas e sarcasmos nas cabeças dos cavalheiros pró-acordo - e não só, nos anti-mim também). A evolução linguística é uma coisa que acontece, mas que não se deve forçar. O Português do Brasil (PT BR) é uma língua muito mais aberta à mudança, do que o nosso (PT PT), e por isso teve uma evolução ortográfica, sintáctica, semântica, lexical e tantas mais, muito diferente da nossa - diferente, nem superior, nem inferior. E é esta diferença, esta variedade que defendo dever ser respeitada. É óbvio que, no último acordo, alguém escolheu fazer essas alterações sem consulta ao falante comum, mas foi numa altura em que a taxa de alfabetização era menor, logo, o falante comum também se queixava menos, sendo que não tinha consciência linguístico-ortográfica, ou pelo menos uma noção da semiologia da ortografia - os alfabetizados, particularmente os que viviam da escrita, esses, queixaram-se, e muito.
Há uma questão, que já referi, e que parece estar na linha da frente dos defensores do acordo, essa coisa vaga da representação ortográfica da fonética. Quanto a isso, estamos a criar regras, ou a destituir a ortografia de qualquer tipo de regras? Dizia um admirável senhor, no (abominável) Prós e Contras deste dia 14, com jocoso sarcasmo, que as consoantes só se eliminam onde, de facto, não se dizem, provocando as pessoas que eram contra o acordo com questões/respostas do género "Diz o c, em facto? Então, escreva-o. Diz o p, em baptismo? Não o escreva, é simples." Muito bem. E isto é suposto vir facilitar a aprendizagem e assimilação fonético-ortográfica dos alfabetizandos. Isto só lhes dá uma margem de manobra tal, que qualquer coisa pode passar a ser correcta. E as variações regionais? Abrem excepções, também? Nas regiões em que as palavras acabadas geralmente em r são oralmente seguidas de um som "e" ou "i", poderão passar a escrever, a título de exemplo, "senhore", ou "senhori"? É que isso é que é representar concretamente a oralidade.
Talvez eu não queira mesmo ceder a isto por haver, ainda que infimamente, qualquer coisa, em mim, que não tem grande amabilidade para com o PT BR. Todas as pessoas que me conhecem sabem que nutro um ódio de estimação, irracional, de resto, como bom ódio de estimação, que é, para com o Brasil, mas a questão aqui nem é essa. Não me assusta a ideia de me submeter ao país que tem mais falantes do Português, no mundo. Cresci a ler bandas-desenhadas em PT BR e sobrevivi a isso. Nunca tive dúvidas em perceber que ótimo e óptimo são a mesma palavra. E não percebo porque é que, já que a grande questão de tudo isto é económica e política, e não linguístico-social, e as editoras/livrarias brasileiras querem entrar em competição noutros mercados fora do brasileiro, não entram logo nesses mercados. Entrem. Sem acordos. Os portugueses iriam perceber à mesma o português evoluído e aberto e moderno que vocês têm.
Já agora, em jeito de provocação, dizia uma mulher, brasileira, no Prós e Contras, que não eram só os portugueses que iam abdicar de algumas coisas, eles, brasileiros, também teriam que o fazer. Ah, sim? Portanto, em nome da pseudo-representatividade máxima da fonética, em termos dos signos, alguém vai obrigar os brasileiros a escrever "cidadji" em vez de cidade, "gostxi" em vez de goste, "tau" em vez de tal e "campãia" em vez de campanha? Não me parece...

terça-feira, abril 15, 2008

Lançamento do disco dos Dead Combo, "Lusitânia Playboys", fnac Chiado, 14.04.08


Lá estávamos nós, eu, a minha irmã e o Jorge, a ver livros, eu já com uma cópia do álbum debaixo do braço, assegurando para mim mesmo que "este, já ninguém mo tira". Tinha sido a última cópia que tinha encontrado na estante da música portuguesa, e por nada a queria perder. Nas colunas um funcionário da loja anunciava o lançamento do disco, pelas dezoito horas e trinta minutos dessa mesma tarde, Lusitânia Playboys, dos Dead Combo - nome que, de resto, pronunciou estranhamente demasiado à inglesa. Mas nada de mais.
O disco estava mais barato do que me tinha sido assegurado por Pedro Virtuoso Gonçalves, contrabaixista e "multi-instrumentista" dos Dead Combo, dado que me custou menos dois euros do que estava a contar gastar. Foi uma pequena felicidade. Graças à fnac pelos preços verdes, ainda que isso seja extremamente ecológico-natural.
Um pouco antes das seis e meia, dirigimo-nos para a pequena sala de concertos da fnac do Chiado, a fim de arranjarmos um lugar mais ou menos decente, de onde assistir ao espectáculo. Já só havia uns no chão, perto de pessoas que, pelo aspecto, pelo cheiro e pelas conversas, seriam alunos de Belas Artes. Isto pode parecer estranho, mas dentro de minutos dávamos graças a qualquer entidade divina pelos lugares que arranjámos, já que a sala mínima da fnac tinha ficado a abarrotar.
Sons de rua, havia ali qualquer coisa que me fazia lembrar os anos trinta ou quarenta do século passado, naquela gravação que criou o ambiente para a entrada do Tó Trips e do Pedro Gonçalves, já nos trajos que lhes proporcionam entrar na "verdadeira" pele de Dead Combo - a cartola do Tó e o fato completo, roçado, do Pedro, e ali os tínhamos, os Dead Combo, sentados frente a frente, a abrir com Sopa de Cavalo Cansado, aliás, a primeira música do cd. O Jorge alegava que nunca houvera visto um contrabaixo e eu fiz questão de informar que ainda dois dias antes tinha assistido a um concerto de um dos melhores contrabaixistas nacionais. Quem pode, pode, caramba! Como era uma apresentação (não, não vou chamar-lhe showcase, peço perdão), eu já contava que fosse curta. Ainda assim, tempo para ouvir Rak Song, Like a Drug (uma versão de uma música dos Queens of The Stone Age, que creio estar melhor no arranjo dos Dead Combo, do que na versão orignal), Canção do Trabalho D.C., Putos a Roubar Maçãs, Malibu Fair, Manobras de Maio 06 e Cuba 1970 (são as de que me lembro, anunciadas pelo Tó Trips num tom monocórdico, fazendo lembrar vagamente locutores de rádios antigas). Muita guitarra, muito contrabaixo, muita melódica - dir-se-ia que tínhamos entrado num saloon típico dos filmes de Sergio Leone, onde, em vez do piano desafinado e das dançarinas de can-can, a Hermínia Silva puxava o Pacheco para que tocasse um fado qualquer. E o Homem sem Nome (a personagem do Clint Eastwood na trilogia Dollars) bebia um whisky ao balcão, entre velhos que acabavam de chegar da vindima e da poda das macieiras - tudo isto na Baixa de Lisboa, numa loja de franchise internacional. Um pouco menos de meia hora, mas excelentemente brutal, de princípio ao fim. Nas palavras do Trips: "amanhã há mais." E despediu-se, seguindo ambos para os bastidores. Fiquei desolado, porque tinha mesmo de me ir embora, voltar para Óbidos na Rápida das 20:15, já que a seguir a essa só tinha uma última, às 21:00, e queria um autógrafo. Pedrocas: para a próxima, cravo-vos um autógrafo antes, enquanto andarem a vaguear pela loja sem estarem na pele de Dead Combo. Garanto. Serei um stalker de gabarito.

Já agora: o cd é, na minha opinião, até agora, o melhor deles, e sugiro que quem gostar se dirija imediatamente a uma loja de discos e o adquira. Para além do mais, vem com um dvd que inclui um concerto no Maxime, o making of do Lusitânia Playboys e todos os videoclips oficiais que já foram lançados, até hoje. Por cerca de 17 euros, vale bem a pena, sem pensar duas vezes, comprar este álbum, que é uma preciosidade da música alternativa/indie nacional (e não só nacional, bem entendido). Vão comprar. A sério.

N.A.: Dei por mim, quando estava a ver o dvd, a reconhecer o Carlos Bica no making of do Lusitânia Playboys. Tendo ido conferir aos créditos do disco, posso, de fonte segura, afirmar que realmente Carlos Bica, esse deus do contrabaixo, é artista convidado dos Dead Combo neste álbum. Iupi (inserir smiley indicativo de folia/pândega/alegria/maluquice exacerbada)!

domingo, abril 13, 2008

Festival de Jazz de Valado dos Frades 08 - 12 de Abril


Eram umas oito e meia e eu estava atrasado. Tive ainda tempo de aquecer uns restos de arroz de cenoura, que tinham sobrado de há uns dois ou três dias, fritar uns croquetes à pressa, comer tudo em menos de cinco minutos e correr para o largo, onde era suposto estar há um quarto de hora. Já lá estava o Nené e íamos ainda ter de esperar pelo Ricardo - que era, no fundo, a nossa mais que requerida boleia para Valado dos Frades, local onde, anualmente, de há cerca de dez anos a esta parte, decorre aquele que é o melhor festival de jazz da região e, arrisco-me a dizê-lo, um dos melhores a nível nacional, se bem que talvez pouco divulgado.
A viagem teve os seus percalços, já que era a primeira vez que o Ricardo ia para aqueles lados e, não querendo seguir as minhas indicações, acabou por se demorar mais um bocado. Eventualmente, lá se decidiu a seguir pela autoestrada até à saída marcada com "V. dos Frades", que nos deixou à porta da dita vila (aldeia? Enfim). Seguimos em direcção ao salão da Biblioteca Instrução e Recreio (BIR), onde, nos últimos três anos, têm decorrido os espectáculos, apenas para nos depararmos com as portas fechadas. Faltavam à volta de trinta minutos para as dez horas, hora marcada para o início do concerto, e nós achávamos assaz estranho que estivesse tudo ainda tão apagado e quieto, portanto, entrámos no café ao lado (mais a tasca ao lado), que faz parte do salão, também, para perguntarmos se era ali que estava a decorrer o festival este ano. Não era. A donzela que nos atendeu largou com pouca prontidão o aparelho de televisão no qual assistia a um documentário acerca de tatuagens, dirigiu-se ao balcão e inquiriu, com cara de poucos amigos, se íamos desejar algum produto em exibição no seu estabelecimento. Sentimo-nos obrigados a consumir, e, no fim de termos adquirido, nomeadamente, um café e um pacote de amendoins cobertos, lá nos sentimos no direito moral de pedir à excelsa criatura que nos indicasse, por obséquio, se era, ou não, ali, que ia Carlos Bica dar o seu concerto de jazz. Não era, respondeu ela, prontamente. Não era ali, embora tivesse, de facto, sido, durante três anos consecutivos. O nosso pensamento uníssono deve ter sido qualquer coisa na base semântica da interjeição "bolas!", assim mesmo, exclamativa, e o mais exclamativa possível. Pronto, tudo bem. Então, onde é, este ano? E ela indicou. Era na sala da BIR, junto da praça, só uns metros mais abaixo. Vai-se bem a pé e há setas a ajudar. Porreiro. Mas as provações no café do salão da BIR não tinham acabado. Enquanto o Ricardo acabava de saborear o seu café, surge a alegação de que ali já não havia jazz, mas havia noite africana. Rimo-nos, pensando tratar-se somente de um desabafo, de uma brincadeira, de um momento de intimidade espirituosa, típica dos trabalhadores em locais como aquele. Nisto, o Nené, virando-se para trás, para ver os programas afixados no placard de corticite, puxa-me pelo braço, apontando, com ar incrédulo, para o programa de uma Noite Africana, animada musicalmente por dois DJs cujo nome não fixei, e cujo preço de admissão era de 2 Africanos e meio, sendo que as bebidas estavam a 0,80 Africanos. Pedimos ao Ricardo, encarecidamente, que se apressasse a beber o seu café, embora, antes de abandonarmos com relativa celeridade o bendito cafezinho, a sua exploradora ainda nos tenha dirigido um profundo "vocês deviam era ficar para este, que isto é que é para a vossa idade". Obrigado, mas não, obrigado. Descemos até à praça, e lá estavam as setas e as indicações preciosas "Sala da BIR - 11º Festival de Jazz Valado dos Frades". Passámos também por uns jovens de boné e fios dourados com demasiado bling, que soubémos, à partida, virem a ser frequentadores, por 2.5 Africanos, do salão da BIR, mais acima.
Pagámos os oito euros (nada de oito "jazzes", ou oito "festivais", ou oito qualquer coisa - oito EUROS), e fomo-nos sentar o mais perto da frente possível. Este ano as cadeiras e as mesas já não eram as de madeira, decrépitas, a que o festival do Valado me tem vindo a habituar e, por isso mesmo, desconfiei. O ambiente podre e gasto era uma coisa que me agradava sobremaneira, e de repente vi-me num sítio mais moderno, mais in, a apostar mais num design minimalista, e tal. Abri o preçário. Ok, design minimalista, mas, ah!, os amendoins não falham! Amendoins - €0.50. Fixe. Cerveja - €1.40 para cima, mas, como não bebo, tudo bem. Whisky, que ó que se quer: €1.50. A noite promete. Esperámos. A sala encheu. Havia pessoas na balaustrada, em cima, pessoas em pé, atrás e dos lados, as mesas cheias. De repente era como se tivessem voltado a substituir as cadeiras muito bauhaus pelas cadeiras de bar de jazz dos anos vinte sem restauro. Estava-se bem, respirava-se música, bem-estar, conforto, amizade, tudo, mas, sobretudo - jazz. As horas arrastavam-se, nós acabávamos o primeiro de três sacos de amendoins e, da banda, nada.
Deviam ser perto das onze, quando o Carlos Bica e amigos/convidados (pareceram sempre muito mais amigos, do que convidados) subiram ao palco. Afinar os instrumentos, e tal. José Salgueiro na bateria, Mário Delgado na guitarra, João Paulo Sousa no piano, órgão e acordeão, e Carlos Bica no contrabaixo. Quatro nomes preciosos do jazz (e da música, em geral) nacional juntos num palco, mesmo à nossa frente, um deles já tendo sido considerado o melhor contrabaixista de jazz do país - eu não estava em mim. O Mário Delgado grava uma malha, põe no loop e eles começam. Vem-me à cabeça uma palavra: genialidade. Aquilo não era só jazz, e com o decorrer da noite eu só viria a comprovar isso ainda mais. Eles riam-se e divertiam-se e a primeira música ainda não ia a meio. Não era só genialidade. Era algo mais. E ali na primeira fila, com dois amigos do melhor, whisky, amendoins, jazz do bom, intérpretes soberbos, em todo o lado olhares simpáticos, compreensivos, todos sentíamos o mesmo; não era só genialidade, nem perto. Era intimidade. Era isso.
Eles tocaram temas dos álbuns mais recentes e mais antigos do Carlos Bica, composições do Mário Delgado e do João Paulo Sousa, e todas as músicas, todas, da primeira à última, respiravam, transpiravam, exalavam, transmitiam, em última análise, jazz. Livre. Um jazz que era tudo. Era rock, era indie, era avant-garde, era experimental, era tango com laivos de salsa. E estar no meio daquilo, fazer parte daquela experiência foi uma coisa que me foi muito. Nunca a companhia de bons amigos me soube tão bem. Nem o whisky, nem os amendoins. É que não era por isso. Cada um dos quatro era genial no que fazia, e seria injusto destacar um, de entre os outros três. Desde as transições pizzicato para arco (e vice-versa), dos slaps e demais "invenções" no contrabaixo, por parte do Carlos Bica, passando pelas batidas ora frenéticas, ora calmas, ora dixie, ora avant-garde, do José Salgueiro, pelas técnicas, efeitos de ruído e de som, agudos e graves, tremolos, distorções e demais genialidade (eu vou repetir muitas vezes esta palavra) do Mário Delgado, a acabar na fluidez e naturalidade com que o João Paulo Sousa tocou cada um dos seus instrumentos (particularmente o acordeão, nas partes dificílimas que fez parecer tão fáceis e suaves de executar). Era tudo como devia ser sempre. Iceland, Believer, White Vivaci, Um Balão na Cama do Faquir, Roses For You, são apenas alguns dos temas de cujo nome me recordo. Qualquer um deles brutal, grande, espectacular. E esses adjectivos de apreço e de reconhecimento de uma qualidade acima da média.
Viram-se senhoras a abanarem-se freneticamente ao som de batidas, malhas e afins, que se costumam ver mais no rock do que no jazz, viram-se casais que se beijavam ao som da música, amigos que falavam, pessoas bêbedas que gritavam, do fundo da sala, "vai, Bica!, e "dá-lhe, Bica!", entre variados guinchos, gritos e manifestações vocais de reconhecimento pelo mérito dos músicos - às quais, dentro em breve, me juntei. Palmas, sempre muitas palmas, e três encores, ao que, no último, o próprio Carlos Bica alertou que não valia a pena ficarmos a bater palmas e a chamá-los, que eles precisavam de descansar a seguir.
Obviamente que a noite ainda me ofertou, extrema graciosidade do Nené ao abrir um saco de amendoins, um copo de whisky vertido sobre as calças, mas, enfim, sempre teve o seu não-sei-quê de divertido, e tal, essa parte fraterna e amável para com as minhas pernas.
Note-se que, depois do concerto, ainda fomos ao Trombone, onde o Vítor passava, precisamente, Carlos Bica, visivelmente triste por não ter podido ir. Nós relatamos a coisa. Não serve. Não é igual. Mas, eh, pá... Vítor, foi o que se arranjou. Para a próxima, apareça por lá.
E quando saímos da sala da BIR, a caminho do carro, a noite africana já tinha acabado e as pessoas da minha idade estavam todas com péssimo ar, à porta do salão, com os seus bonés e demais trajo à lá hip-hop gangsta, provavelmente desiludidos com a falta de piteuzinhos que aparecessem.

Para o ano há mais.

N.A.: na verdade, vai haver mais ainda este ano, mas este vosso prezado não deve já frequentar, em qualquer outro dos dias que ainda faltam, o festival. Portanto, no que me diz respeito, em princípio, só para o ano haverá, de facto, mais. Quanto aos da noite africana, esses devem ter mais bastante mais regularmente, por isso, não terão, também, de esperar um ano. Ok, é relativo, haver mais para o ano. Mas há. Também.

sábado, abril 12, 2008

Mogwai - Travel Is Dangerous



Back to this, it seems... at least, for a little while longer. Just bear with it.

quarta-feira, abril 09, 2008

A MENSTRUAÇÃO QUANDO NA CIDADE PASSAVA

A menstruação quando na cidade passava
o ar. As raparigas respirando,
comendo figos - e a menstruação quando na cidade
corria o tempo pelo ar.
Eram cravos na neve. As raparigas
riam, gritavam - e as figueiras soprando de dentro
os figos, com seus pulmões de esponja
branca. E as raparigas
comiam cravos pelo ar.
E elas riam na neve e gritavam: era
o tempo da menstruação.

As maçãs resvalavam na casa.
Alguém falava: neve. A noite vinha
partir a cabeça das estátuas, e as maçãs
resvalavam no telhado - alguém
falava: sangue.
Na casa, elas riam - e a menstruação
corria pelas cavernas brancas das esponjas,
e partiam-se as cabeças das estátuas.
Cravos - era alguém que falava assim.
E as raparigas respirando, comendo
figos na neve.
Alguém falava: maçãs. E era o tempo.
O sangue escorria dos pescoços de granito,
a criança abatia a boca negra
sobre a neve nos figos - e elas gritavam
na sombra da casa.
Alguém falava: sangue, tempo.

As figueiras sopravam no ar que
corria, as máquinas amavam. E um peixe
percorrendo, como uma antiga palavra
sensível, a página desse amor.
E alguém falava: é a neve.
As raparigas riam dentro da menstruação,
comendo neve. As cabeças das
estátuas estavam cheias de cravos,
e as crianças abatiam a boca negra sobre
os gritos. A noite vinha pelo ar,
na sombra resvalavam as maçãs.
E era o tempo.

E elas riam no ar, comendo
a noite,
alimentando-se de figos e de neve.
E alguém falava: crianças.
E a menstruação escorria em silêncio -
na noite, na neve -
espremida das esponjas brancas, lá na noite
das raparigas
que riam na sombra da casa, resvalando,
comendo cravos. E alguém falava:
é um peixe percorrendo a página de um amor
antigo. E as raparigas
gritavam.

As vacas então espreitando,
e nos focinhos consumia-se o lume em silêncio.
Pelas janelas os violinos
passavam pelo ar. E a menstruação nas raparigas
escorria pela sombra, e elas
gritavam e comiam areia. Alguém falava:
fogo. E as vacas passavam pelos violinos.
E as janelas em silêncio escorriam
o seu fogo. E as admiráveis
raparigas cantavam a sua canção, como
uma palavra antiga escorrendo
numa página pela neve,
coroada de figos. E no fogo as crianças
eram tocadas pelo tempo da menstruação.

Alimentavam-se apenas de figos e de areia.
E pelo tempo fora,
riam - e a neve cobria a sua página de tempo,
e as vacas resvalavam na sombra.
Em silêncio o seu lume escorria das esponjas.
Partiam-se as cabeças dos violinos.
As raparigas, cantando as suas crianças,
comiam figos.
A noite comia areia.
E eram cravos nas cavernas brancas.
Menstruação - falava alguém. O ar passava -
e pela noite, em silêncio,

a menstruação escorria pela neve.


Herberto Helder, A Máquina Lírica, in Ou O Poema Contínuo, Lisboa, Assírio & Alvim, 2004