quinta-feira, outubro 20, 2005

Michelle

Porventura não sei quem é o que me olha de um lado estranho. Somos quatro numa sala de café qualquer, eu e outros três, um desses três fuma e não sou eu, dois bebem e dentro desses dois que bebem um bebe moscatel do douro e esse também não sou eu, três lêem um livro e entre esse três também eu leio. Dois olham para mim e pensam não sei em quê e eu penso em mortes, nas formas como os decapitaria, nas formas como os amarraria e cravaria lâminas primeiro devagar, depois com força, cada vez e sempre com mais força, limpando tudo cuidadosamente com um pano, as lâminas enferrujadas só no fim, um ou outro vidro aqui e ali, álcool q.b. sobre as feridas, sal a gosto por debaixo da pele;
porventura não sei os nomes de ninguém, destes três e até destes quatro, e penso em mortes, nas suas, na minha, um homem de preto a atirar um piano de um quinto andar sobre um corpo e esse corpo ligaduras num hospital
soro
monitor de tensão
sons aquáticos nas artérias
moscatel nas artérias,
michelle entra no quarto trazendo flores e paz e nesse momento ácido pítrico na cara de michelle, para que se desfigure e morra sufocada no seu próprio vómito e no gás do ácido entretanto já pelo chão.

sorvo um café devagarinho. e ninguém sequer sonha que sou isto tudo cá dentro.

1 comentário:

Anónimo disse...

és um homem livre dentro de ti...como qualquer um de nós...um daqueles três que possivelmente está na sala de café, até poderei ser eu, como também eu poderei pensar assim dos outros três

fica bem e vai postando, mais assiduamente

acredita que tens mais gente a ler este blog do que aquilo que imaginas

respeito a tua escrita no "lonely gigolo", mas para ser sincero, aprecio muito mais a tua outra parte de ser como és, quando escreves neste espaço

fica bem